É o relatório.
De saída, tenho que a preliminar arguida pela ré não colhe.
Quanto à alegada ilegitimidade passiva, cabe consignar que - ao contrário
do que afirma a demandada -, ela ostenta legitimidade para figurar no polo passivo da relação processual para discussão de valores relativos à intermediação das vendas e à cobrança da taxa SATI, pois tendo figurado no contrato firmado com a autora na qualidade de promitente vendedora, responde indiscutivelmente à totalidade dos valores pagos como parte, e em consequência, do negócio celebrado.
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Rejeita-se, portanto, a alegação.
Quanto ao mérito, cuida-se de ação que visa à restituição dos valores adimplidos a título de corretagem, taxa SATI e taxa de transferência. Julgada procedente, sobreveio o presente recurso, que está a merecer parcial acolhida.
Primeiramente, não era mesmo o caso de se falar na devolução dos valores pagos a título de corretagem.
Segundo informa a autora, adquiriu unidade habitacional e, na oportunidade, já efetuou o pagamento da comissão de corretagem, no importe de R$ 82.793,44 (oitenta e dois mil, setecentos e noventa e três reais e quarenta e quatro centavos).
Sustenta que não contratou o serviço mencionado, tendo tão somente comparecido ao stand de vendas da requerida. Alega ainda que as cláusulas que imputam aos compradores o pagamento do encargo são abusivas, pois elaboradas em afronta aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, caracterizando ‘venda casada’. Dessa forma, pleiteia a devolução do montante dispendido.
Atente-se, porém, que embora a autora sinalize que arcou indevidamente com a contratação, afere-se dos autos que, na data da aquisição, celebrou contrato intitulado “Contrato de Corretagem Imobiliária” (fls. 178/182) e já efetuou o pagamento do serviço prestado. Aliás, da análise da planilha de fls. 68 observa- se que a totalidade dos valores desembolsados foi diretamente paga a quem intermediou a negociação. Logo, evidente que a transação não era desconhecida.
Lembre-se que, nos termos do artigo 725 do Código Civil, “a remuneração é devida ao corretor uma vez que tenha conseguido o resultado previsto no contrato de mediação, ou ainda que este não se efetive em virtude de arrependimento das partes”.
E conforme preleciona M. HELENA DINIZ (Código Civil Anotado, 12ª Ed., São Paulo, Saraiva, 2006, p. 587):
“O corretor tem direito à remuneração se aproximou as partes e elas acordaram no negócio, mesmo que, posteriormente, se modifiquem as condições ou o negócio venha a ser rescindido ou desfeito, inclusive por arrependimento de qualquer dos contratantes (RT, 288:799, 262:265 e 280, 590:101, 680:202, 263:508, 203:494, 465:180, 712:220; Ciência
Jurídica, 70:122 e 353, 69:107; RSTJ, 51:191, 90:109; EJSTJ, 12:68;
RJTJSP, 131:99, 127:41)”.
E como já tive a oportunidade de decidir no julgamento da Apelação Cível nº. 631.863.4/9-00 do Foro Regional de Pinheiros da Comarca da Capital - cumprido com o objeto do contrato de corretagem, levando às partes a celebrarem o contrato de promessa de compra e venda do imóvel, a comissão era mesmo devida, independentemente até mesmo de posterior desfazimento do negócio jurídico, razão pela qual despropositada a pretensão.
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Aliás, nesse sentido, recentemente, a jurisprudência desta Corte assim decidiu:
“MEDIAÇÃO - Comissão - Cobrança - Compra e Venda - Rescisão - Comprador que assumiu a obrigação de pagar a comissão mesmo diante de rescisão do negócio intermediado - Devolução da importância paga - Impossibilidade - Sentença reformada - Recurso provido.”. (TJSP - Ap. Cível nº 103.122.7-0/3 - São Paulo - 35ª Câmara de Direito Privado - Rel. Melo Bueno j. 29/08/08).
“Embargos Infringentes - Rescisão Contratual - Compromisso de Compra e Venda - Pretensão ao prevalecimento do voto vencido - Improcedência - Irresignação decorrente da má interpretação do v. acórdão - Verba de corretagem devida mesmo com o desfazimento do negócio - Restituição do valor pago a cargo do promitente vendedor - Entendimento equivocado do recorrente - Embargos rejeitados.” (TJSP
- Emb. Infring. nº 529.528.450-2 - Piracicaba - 8ª Câmara de Direito Privado - Rel. Joaquim Garcia - j. 08/10/08).
Portanto, o valor pago a título de comissão para terceiro que atuou na intermediação do negócio (seja na qualidade de corretor, seja como prestador de serviço) não está a comportar devolução.
Como explica C. L. BUENO DE GODOY (in A. C. PELUSO [coord.], Código Civil Comentado, Barueri, Manole, 2007, p. 587), “na corretagem imobiliária, ter-se-á evidenciado o proveito da aproximação sempre que as partes tiverem firmado, se não a escritura de venda e compra, uma promessa ou, simplesmente, um recibo de sinal ou equivalente”.
Por sinal, ainda que a autora sinalize que não foi o terceiro responsável pela aproximação (entre comprador e vendedor), é evidente que após seu comparecimento ao stand de vendas foi este terceiro o responsável pela apresentação do empreendimento e consequentemente quem levou a celebração do negócio, de forma que a comissão de corretagem era mesmo devida.
Aliás, e recentemente, isso manifestei ao decidir matéria idêntica por ocasião do julgamento da Apelação Cível nº 0035867-58.2012.8.26.0576, da Comarca de São José do Rio Preto, julgada em 27.06.2013.
De outro lado, quanto à cobrança do chamado SATI - Serviço de Assessoria Técnico-Imobiliária, no montante de R$ 14.859,32 (fls. 68), comporta mesmo
devolução. Isso porque, não havendo sido especificado o seu alcance, de forma diferenciada em relação aos serviços prestados pelos corretores, sua exigência constitui verdadeiro bis in idem em relação à comissão - esta, como acima afirmado, efetivamente devida -, sendo de rigor a manutenção da condenação da ré à sua devolução em valor singelo, ante a inexistência de má-fé.
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Aliás, esta Câmara pacificou o entendimento nesse sentido (cf.: Apelação Cível nº 0145152-90.2011.8.26.0100, da Comarca da Capital, Rel. Paulo Alcides, j. 30.08.2012; Apelação Cível nº 0145194-42.2011.8.26.0100, da Comarca da Capital, Rel. Alexandre Lazzarini, j. 06.09.2012; e Apelação Cível nº 025082-16.2011.8.26.0562, da Comarca de Santos, Rel. Fortes Barbosa,
28.06.2012), de forma que descabe mesmo qualquer rediscussão sobre a abusividade encerrada por tal cobrança.
Por fim, bem andou o julgador ao determinar a restituição, de forma simples, do valor despendido a título de ‘taxa de anuência’ para a cessão contratual.
Isso porque dúvida não há em relação à abusividade de cláusula que condiciona a transferência de direitos e obrigações decorrentes do instrumento firmado ao pagamento de uma taxa em favor da promitente vendedora, no percentual de 3% (três por cento) sobre o valor total da venda (15.1 - fls. 57), a título de taxa de transferência e pela anuência da cessão.
é que embora se reconheça que eventuais alterações no curso da negociação importam na adoção de providências junto à vendedora (consistentes na atualização de cadastros, análise de perfil e até mesmo de crédito em relação aos terceiros cessionários), forçoso reconhecer que tais procedimentos não se traduzem em atividades complexas. Ademais, evidente que fazem parte da rotina empresarial e não justificam a cobrança de valor, razão pela qual de rigor a manutenção da condenação da ré à devolução simples do valor dispendido pela autora a esse título.
nesse sentido:
“Apelação - Ação declaratória de nulidade de cláusula contratual - Improcedência - Controvérsia a respeito da previsão do pagamento de uma taxa de transferência, correspondente a 3% do valor do contrato, para anuência da incorporadora à cessão dos direitos da proposta pelo compromissário comprador originário - Mitigação do princípio do pacta sunt servanda - Abusividade da cláusula reconhecida por ofensa ao art. 51, IV do CDC - Precedentes do Tribunal - Ausência de indícios da insolvabilidade dos terceiros adquirentes - Adimplemento do comprador originário de mais de metade do valor do imóvel - Anuência da incorporadora como consequência do reconhecimento da nulidade
- Provimento para julgar procedente a ação.” (TJSP - Ap. Cível nº
0046659-50.2011.8.26.0562 - Santos - 4ª Câmara de Direito Privado - Rel. Enio Zuliani - j. em 04.04.2013).
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“COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - Ação
declaratória de nulidade de cláusula contratual c.c. pedido de restituição de indébito - Apelante que se insurge contra a cobrança da taxa de anuência correspondente a 3% do valor do contrato em caso de cessão de direitos do comprador a terceiro - Despesas administrativas inerentes à própria atividade da vendedora que não justificam a cobrança - Reconhecimento da abusividade de cláusula inserida em contrato de adesão (art. 51 do CDC) - Apelante titular de direitos e obrigações contratuais que podem ser transferidos sem qualquer ônus ou anuência da apelada - Devolução em dobro dos valores cobrados a maior, nos termos do art. 42 do CDC - Descabimento - Ausência de prova de má-fé na cobrança - Recurso parcialmente provido para declarar nula a cláusula contratual 14.2 e condenar a apelada na devolução da taxa de anuência cobrada no valor de R$ 6.180,62, de forma simples, com correção monetária calculada pela Tabela do E. TJSP, desde o desembolso e juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação, com inversão do ônus da sucumbência.” (TJSP - Ap. Cível nº 0703171-29.2012.8.26.0704 - São Paulo - 7ª Câmara de Direito Privado
Rel. Mendes Pereira - j. em 08.05.2013).
“Venda e compra de imóvel. Aditamento. Taxa de Anuência. Concessão da tutela antecipada para afastar a cobrança. Cessão condicionada pela vendedora ao pagamento de taxa de cessão. Tutela bem deferida. Ausência de impedimento legal ou contratual à pretendida alteração. Recurso improvido.” (TJSP - Ap. Cível nº 0154006-14.2013.8.26.0000
Guarulhos - 4ª Câmara de Direito Privado - Rel. Maia da Cunha - j. em 17.10.2013).
Por sinal, e recentemente, isso igualmente manifestei por ocasião do julgamento da Apelação Cível nº 0004597-52.2013.8.26.0100, da Comarca de São Paulo.
nada mais é preciso dizer.
Destarte, em resumo, dá-se parcial provimento ao recurso da requerida tão somente para afastar a condenação à devolução dos valores pagos a título de comissão de corretagem, ficando mantida a r. sentença em seus ulteriores termos.
Com o resultado, fica reconhecida a sucumbência recíproca, devendo cada parte arcar com as custas que desembolsou e com os honorários dos seus respectivos patronos.
nestes termos, dá-se parcial provimento ao recurso.
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