PARECER: 764/2014–ML
ASSUNTO: REPRESENTAÇÃO
REFERÊNCIA: PROCESSO Nº 21.003/2014-e
EMENTA: REPRESENTAÇÃO. CONCORRÊNCIA Nº 5/2014 – TERRACAP. POSSÍVEIS IRREGULARIDADES. DECISÃO Nº 3.273/2014. CONHECIMENTO. SUSPENSÃO DO CERTAME. APRESENTAÇÃO DE INFORMAÇÕES PELA JURISDICIONADA. UNIDADE TÉCNICA SUGERE A IMPROCEDÊNCIA DA REPRESENTAÇÃO E CONTINUIDADE DO CERTAME. PARECER CONVERGENTE DO MPC/DF. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA VINCULAÇÃO AO EDITAL, JULGAMENTO OBJETIVO, ISONOMIA E CAUSALIDADE. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO PRIMÁRIO.
Cuidam os autos de Representação1 formulada pela Preview Participações S.A., versando sobre suposto ato lesivo ao Erário praticado pela Companhia Imobiliária de Brasília – TERRACAP, durante o processamento da Concorrência nº 5/2014 que teve por objeto a venda de imóveis, em específico, lotes em diversas regiões administrativas do Distrito Federal.
A Representação oferecida pela Preview Participações S. A. foi conhecida pelo c. Tribunal por meio da r. Decisão nº 3.273/2014, in verbis:
“O Tribunal, por unanimidade, de acordo com o voto do Relator, decidiu: I – conhecer, com fulcro no § 1º do art. 113 da Lei nº 8.666/93, c/c o § 1º do art. 195 do RI/TCDF, da Representação e seus anexos (e-DOC AC29BD76), apresentada pela empresa Preview Participações S.A; II – suspender, cautelarmente, com esteio no art. 198 do Regimento Interno do Tribunal, o prosseguimento do certame lançado pelo Edital de Concorrência nº05/2014, no tocante ao item 41 (QD 04, Conj. 03, Lt. 02, Paranoá/DF), até ulterior deliberação desta Corte de Contas acerca dos fatos apontados pela Preview Participações S.A.; III – determinar à Companhia Imobiliária de Brasília – TERRACAP que, no prazo de 10 (dez) dias, apresente os esclarecimentos que entender pertinentes, acerca da exordial; IV – facultar à empresa Supermercado Maré Mansa Ltda. a apresentação, no prazo de 10 (dez) dias, de contrarrazões à Representação; V – autorizar: a) o encaminhamento de cópia da Representação (e-DOC AC29BD76) à jurisdicionada e à empresa Supermercado Maré Mansa Ltda. a fim de subsidiar o cumprimento da diligência constante dos incisos III e IV; b) dar ciência desta decisão à Representante, informando-a de que as futuras tramitações dos autos em exame poderão ser acompanhadas mediante cadastramento no sistema TCDF Push (www.tc.df.gov.br – Espaço do Cidadão – Acompanhamento por e-mail); c) o retorno dos autos à Secretaria de Acompanhamento, para os devidos fins.”
A Unidade Técnica, por meio da Informação nº 145/2014 – 1ª DIACOMP/SEACOMP2, após analisar as informações encaminhadas pela jurisdicionada por meio do Ofício nº 441/2014 – PRESI3, manifestou-se pela improcedência da Representação, conforme excerto transcrito a seguir:
“(...)
5. Em resposta à diligência contida no item III anterior, a Terracap encaminhou o Ofício nº 441/14, acompanhado do Despacho nº 0107/2014-GECOM (peça nº 13, e-doc 6291456D-c), no qual argumenta, em apertada síntese, verbis:
(...)
O assunto em questão encerra tema afeto à licitação levada a efeito pelo Edital n° 05/2014-Imóveis, mais precisamente no que concerne ao item 41, imóvel denominado como Quadra 04, Conjunto 03, Lote 02, Paranoá/DF, cujos fatos podem ser devidamente averiguados no Processo n° 111.000.688/2014, processo este que reúne documentos referentes à licitação em apreço.
(...)
Naquele certame, a empresa PRIVEW PARTICIPAÇÕES S/A (nome assim descrito na Proposta de compra n° 104026) teve sua proposta sumariamente desclassificada no ato do evento licitatório, tendo em vista que a Comissão, quando da análise da sua proposta, verificou que o valor caucionado para o item era inferior ao valor indicado no edital.
A análise realizada nos eventos licitatórios desta Empresa cinge-se à simples conferência do comprovante de pagamentos de caução que é anexado, diga-se,
grampeado à proposta de compra.
Preliminarmente, o motivo pelo qual se exige que os comprovantes de caução sejam anexados à proposta de compra encontra suporte no fato de que, naquele momento, é o único meio capaz de se atestar, minimamente, que o licitante tenha realizado o pagamento da caução e dado a isso, como corolário, esteja habilitado a participar do certame, conforme prescrição contida no Art. 18 da lei 8.666/93, verbis:
‘Art. 18. Na concorrência para a venda de bens imóveis, a fase de habilitação limitar-se-á à comprovação do recolhimento de quantia correspondente a 5% (cinco por cento) da avaliação’
(...)
Frise-se que em nenhum momento algum participante da Comissão promove juntada de documentos ou mesmo ‘grampeia’ proposta a comprovantes de caução.
Tal medida é restrita e de única responsabilidade dos licitantes, a quem efetivamente deve ser atribuído o devido dever da cautela na regularidade de apresentação das suas propostas. (grifo nosso)
Insta informar que o modelo de licitação desenvolvido nesta Empresa segue as regras delineadas pela Lei 8.666, bem como pelos Princípios Gerais da Administração Pública e sua forma é utilizada e aceita desde sua criação. As propostas de compra são espécies de promessas de pagamento pelos imóveis, cujo preço se apresente como melhor oferta, desde que tais propostas apresentem-se devidamente regulares, nos termos da norma que rege o certame.
(...)
Na hora de se proceder ao julgamento da validade das propostas, antes da sua leitura, os membros da Comissão, na presença de todos, verificam condições prévias e estabelecidas no edital, preenchimento dos campos obrigatórios das propostas tais como número do item pretendido, o valor oferecido, o nome do proponente, as condições de pagamento, assim como a sua assinatura e se há comprovante de pagamento de caução anexado e, nesse caso, se o valor ofertado é igual ou superior àquele apontado no regramento do certame.
In casu, o licitante recorrente, reconhecidamente (expediente n° 5413/2014), deixou de prover a devida cautela ao realizar a juntada do comprovante de pagamento de caução à sua proposta de compra. Naquele momento, como já mencionado, análise que se aplicara à espécie cingiu-se a simples conferência do valor assinalado no comprovante de pagamento de caução anexado à proposta de compra, do que, verificada irregularidade do valor caucionado, inferior ao assinalado no edital, operou-se a sua desclassificação sumária. (grifo nosso)
A problemática acima exposta agravou-se ainda pelo fato de que, para o mesmo item, houve participantes que, zelosamente, ativeram-se a todos esses requisitos formais, tendo validadas as suas propostas. (grifo nosso)
Outrossim, improcedente é a alegação do requerente quando afirma que a Terracap nada falara quanto ao valor de caução pago a maior para outro pretenso item. Quanto a isso, frise-se que é recorrente, dentro da praxe das licitações desta Empresa, licitantes depositem cauções de maior valor com a finalidade de poderem escolher um outro item na hora da licitação, desde que o valor depositado não seja inferior àquele assinalado no edital. (grifo nosso)
Desta forma, como visto, não há que se falar nem mesmo em rigor excessivo, pois o deslize verificado quando da sua participação não permitiu por parte da comissão, análise que levasse a uma conduta diversa. (grifo nosso)
Não se olvide da capacidade discricionária decisória de que se reveste a ação administrativa frente ao caso concreto, desde que não se contrariem disposições legais e que haja a devida motivação para tanto. No entanto, não sendo visualizado qualquer elemento ensejador, o administrador deve vincular-se às prescrições contidas no edital, porquanto temerária qualquer ação diversa daquelas nele previstas, o que remete ao presente caso. (grifo nosso)
(...)
6. A título exemplificativo, a Terracap informa ter enfrentado situação semelhante quando da realização da sua licitação objeto do Edital n° 09/2011, tendo o Tribunal de Justiça do Distrito Federal proferido sentença no auto da ação n° 2012.01.1.082450-3, favorável àquela Empresa, cujo teor transcreve-se parcialmente a seguir:
(...)
Decido.
FUNDAMENTAÇÃO
(...)
Trata-se de ação proposta por Ágil Serviços Especiais Ltda contra a Terracap e outro, pela qual a parte autora pede a declaração da nulidade do ato administrativo que a desclassificou do certame, sendo assegurada a sua participação e declarada sua vitória. Sucessivamente, requer a nulidade do certame no que tange ao lote 79.
A autora foi desclassificada do certame para aquisição do item 79 do Edital 09/2011 da Terracap (lote 02, conjunto 03, QS 108, Samambaia) por ter apresentado caução inferior à descrita no edital.
A autora, pretendendo adquirir quatro imóveis, realizou quatro depósitos-caução (fl. 80), nos valores de R$ 53.500,00, R$ 54.350,00, R$ 74.500,00 e de R$ 55.350.00.
Contudo, ao entregar suas propostas de compra, anexou o depósito-caução de R$ 54.350.00 à proposta 87152 (relativa ao item 79), e o depósito-caução de R$ 74.500.00 à proposta 87121 (relativa ao item 65), conforme se verifica pela documentação de fls. 227/228 e 204/205.
Em assim agindo, incidiu em equívoco, tendo trocado uma documentação pela outra.
Na realidade, o depósito-caução de R$ 74.500,00 deveria estar atrelado à proposta 87152 (relativa ao item 79) e o depósito-caução de R$ 54.350,00 à proposta 87121(relativa ao item 65).
Contudo, a responsabilidade por tal equívoco é da própria autora, sendo dela a obrigação de realizar a correta juntada da documentação às suas propostas de compra. (grifo nosso)
DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido.
(...)
7. A Terracap observa, ainda, que a questão fora discutida e referendada em sede de Apelação Cível, verbis:
DIREITO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO DA TERRACAP PARA A VENDA DE IMÓVEIS. DESCLASSIFICAÇÃO DE PROPOSTA REALIZADA EM DESCONFORMIDADE COM O EDITAL. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. PROPOSTA ACOMPANHADA DE CAUÇÃO INFERIOR À EXIGIDA PELO EDITAL. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO EDITAL. PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE E DA ISONOMIA.
I. Os atos administrativos são imantados por uma presunção de legitimidade e de veracidade que só pode ser desconstituída mediante prova concludente em sentido contrário.
II. Legitimidade e veracidade são atributos indissociáveis que conferem ao ato administrativo a presunção de terem sido realizados de acordo com a lei e de espelharem a conformidade com os fatos narrados ou atestados pela Administração Pública.
III. Longe está de representar formalismo exacerbado a desclassificação da proposta formulada em desacordo com o edital. (grifo nosso)
IV. Não há que se falar em formalismo, senão em cumprimento estrito das normas editalícias, quando a proposta é desclassificada pelo fato objetivo de sua desconformidade com o edital. (grifo nosso)
V. Como norma básica do procedimento licitatório, o edital submete aos seus termos tanto a Administração Pública como os licitantes, de maneira que não pode ter a sua aplicação ressalvada ou excepcionada, sob pena de ofensa aos princípios da isonomia e da impessoalidade. (grifo nosso)
VI. Recurso conhecido e desprovido. (grifo nosso)
(Acórdão n.770936, 20120110824503APC, Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Revisor: CRUZ MACEDO, 4* Turma Cível, Data de Julgamento: 12/03/2014, Publicado no DJE: 26/03/2014. Pág.: 230).
Diante dos fatos narrados, a comissão optou pela manutenção da desclassificação da licitante representante, mantendo-se o itinerário da licitação que culminou, inicialmente, na pré-classificação da licitante SUPERMERCADO MARÉ MANSA LTDA, devido a sua regularidade de participação, posteriormente tivera o item homologado em seu nome.
Análise
(...)
9. Inicialmente, deve-se dizer que entendemos improcedente o enquadramento do fato ocorrido, a saber a troca das cauções entre dois itens do edital, apenas como ‘pequeno erro material’, como quer fazer crer a autora da Representação.
10. Neste sentido, assiste razão à Terracap quando afirma que a elaboração de propostas é de única responsabilidade dos licitantes, a quem efetivamente, verbis: ‘deve ser atribuído o devido dever da cautela na regularidade de apresentação das suas propostas’.
11. De fato, faltou ao licitante recorrente a preocupação em realizar a juntada do comprovante de pagamento de caução à proposta de compra correta.
12. Entende-se pertinente, igualmente, a observação da Terracap de que, verbis: ‘(...) para o mesmo item, houve participantes que, zelosamente, ativeram-se a todos esses requisitos formais, tendo validadas as suas propostas’.
13. Neste diapasão, entende-se que prover o argumento da empresa Preview implicaria em administrar tratamento diferenciado à mesma, relativamente aos outros participantes do certame, afrontando, desta forma, o princípio da impessoalidade.
14. Discordamos, por oportuno, do argumento da Representante, de que o Estado, ao deixar de perceber certa monta, em razão da observância ao regramento editalício, estaria privilegiando o ‘formalismo exagerado’.
15. No caso analisado, entendemos que seja cristalina a regra estabelecida quanto à apresentação das cauções, associadas às respectivas propostas. Destaque-se, neste sentido, o item 17 do Edital nº 5/2014 que previu, verbis (fl. 31 da peça nº 1 – e-doc AC29BD76):
17 A comprovação de recolhimento da caução se dará mediante anexação do comprovante da transação à proposta de compra, passando a integrá-la.
17.1 O COMPROVANTE DE RECOLHIMENTO DA CAUÇÃO SERÁ APTO A INTEGRAR SOMENTE UMA PROPOSTA DE COMPRA, DEVENDO O LICITANTE, PRETENDENDO CONCORRER EM MAIS DE UM ITEM, RECOLHER AS CAUÇÕES EM TRASAÇÕES SEPARADAS E ANEXAR CADA COMPROVANTE A SUA RESPECTIVA PROPOSTA, SOB PENA DE DESCLASSIFICAÇÃO DE TODAS AS PROPOSTAS APRESENTADAS.
16. Ressaltamos, por óbvio, que ao edital é conferida prévia publicidade nos meios de divulgação próprios, de modo que, a princípio, não deve ter a sua aplicação ressalvada, a fim de garantir a observância aos princípios da impessoalidade e da isonomia.
17. À vista do exposto, somos porque o Tribunal considere improcedente a Representação sub examine.” (Grifos acrescidos e no original).
Por fim, a Primeira Divisão de Acompanhamento propôs ao e. Plenário do c. TCDF que:
“I) levante a suspensão imposta pelo item II da Decisão nº 3273/14, autorizando o prosseguimento do certame lançado pelo Edital de Concorrência nº 05/2014, no tocante ao item 41 (QD 04, Conj. 03, Lt. 02, Paranoá/DF);
II) considere atendida a diligência exarada por meio do item III da Decisão nº 3273/14;
III) considere improcedente a Representação apresentada pela empresa Preview Participações S.A. (e-DOC AC29BD76);
IV) autorize:
a) o encaminhamento de cópia da decisão a ser adotada aos interessados; e
b) o retorno dos autos à SEACOMP para os fins de arquivamento.”
É o relatório. Passo à análise do presente feito.
Preliminarmente, informo que, diante das considerações trazidas pelo zeloso Corpo Instrutivo, a análise deste MPC/DF cinge-se ao exame do mérito da Representação formulada pela Preview Participações S.A.
Compulsando a documentação eletrônica, o Parquet especializado concorda com o esposado pela Unidade Técnica, uma vez que os argumentos trazidos pela jurisdicionada em suas informações foram suficientes para elidir a suposta irregularidade apontada na Representação.
O Capítulo III, Da Caução, do Edital da Concorrência nº 5/2014 – TERRACAP4, dispõe claramente sobre a necessidade dos interessados apresentarem o valor correto da caução para o item disputado, sob pena de serem inabilitados no certame, conforme transcrito abaixo:
“CAPÍTULO III
A) DA CAUÇÃO
16. Para se habilitarem à participação nesta licitação, os interessados deverão, até o último dia útil anterior à data prevista para a realização da licitação, recolher a caução no valor estabelecido no Capítulo I do Edital de Licitação, em qualquer agência do Banco de Brasília S/A – BRB, por meio de depósito ou de transferência eletrônica – TED, para a conta especial (conta-caução da Terracap – CNPJ nº 00.359.877/0001-73 – conta nº 900.102/0 – Agência 121 – Banco 070 – Banco de Brasília) indicada no Edital, vedados depósitos em caixas eletrônicos e em cheques.
16.1. O valor caucionado pelo licitante vencedor constitui parte da entrada inicial ou parte do total da operação à vista.
16.2. Os valores caucionados não serão utilizados ou movimentados, e também não sofrerão qualquer atualização monetária em benefício do caucionante ou da Terracap.
17. A comprovação de recolhimento da caução se dará mediante anexação do comprovante da transação à proposta de compra, passando a integrá-la.
17.1. O COMPROVANTE DE RECOLHIMENTO DA CAUÇÃO SERÁ APTO A INTEGRAR SOMENTE UMA PROPOSTA DE COMPRA, DEVENDO O LICITANTE, PRETENDENDO CONCORRER EM MAIS DE UM ITEM, RECOLHER AS CAUÇÕES EM TRANSAÇÕES SEPARADAS E ANEXAR CADA COMPROVANTE A SUA RESPECTIVA PROPOSTA, SOB PENA DE DESCLASSIFICAÇÃO DE TODAS AS PROPOSTAS APRESENTADAS.
18. Caso o participante tenha caucionado valor para item excluído, poderá fazer opção para outro item, desde que a caução realizada seja igual ou superior ao valor estabelecido para o novo item pretendido, bastando anexar o comprovante à nova proposta de compra.
18.1. Na hipótese de não pretender fazer opção por outro item, deverá depositar na urna sua proposta de compra para o item excluído para que tenha sua caução liberada no prazo de 08 (oito) dias úteis, contados da realização da licitação.” (Grifos acrescidos).
Não bastassem as objetivas e claras exigências constantes do capítulo transcrito acima, o valor da caução, embora calculado com base no percentual estabelecido no art. 18 da Lei nº 8.666/1993, foi expressamente divulgado pela TERRACAP no capítulo I do Edital, senão vejamos:
Item
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Endereço do imóvel
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Área (m²) do lote
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Área (m²) de construção (BÁSICA)
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Área (m²) de construção (MÁXIMA)
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Valor (R$) (mínimo e caução)
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Condições de pagamento
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41 (807373-2)
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QD 04 CONJ 03 LT 02 PARANOÁ
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1.798,63
|
1.798,63
|
3.777,13
|
718.000,00
35.900,00
|
5% de entrada restante em até 180 meses
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(...)
|
(...)
|
(...)
|
(...)
|
(...)
|
(...)
|
(...)
|
43 (807375-9)
|
QD 04 CONJ 03 LT 04 PARANOÁ
|
1.843,76
|
1.843,76
|
3.871,89
|
665.000,00
33.250,00
|
5% de entrada restante em até 180 meses
|
Conforme se observa, o regramento para apresentação da caução, bem como o seu valor exato, foi devidamente definido no instrumento convocatório. O Edital, por sua vez, teve seu prazo de divulgação respeitado nos termos da legislação de regência. Destarte, há de se convir que não houve qualquer óbice ao perfeito conhecimento e entendimento pelos interessados sobre o objeto em discussão nestes autos.
Ora, resta claro que o que ocorreu foi um erro exclusivo por parte da Representante no momento em que inverteu os comprovantes das cauções para os itens de seu interesse. Além do mais, a Comissão não poderia ter conhecimento desse fato, cabendo a ela apenas julgar objetivamente a documentação apresentada no certame. Se a proposta demonstrou-se de valor inferior ao estabelecido no instrumento convocatório, outra não poderia ser a conduta da Comissão a não ser a de inabilitar a Representante – aplicação do princípio da causalidade.
Logo, a inversão dos comprovantes das cauções não deve ser tratada como mero erro material, ao designío do que pretende a Representante. In facto, a proposta apresentada pela Representante não observou o valor mínimo estabelecido no instrumento convocatório para a caução, condição essa essencial para a habilitação.
A contrario sensu, a apresentação de valores superiores aos estabelecidos no Edital para a comprovação da caução são devidamente aceitos, conforme se depreende do estabelecido abaixo:
“CAPÍTULO III
A) DA CAUÇÃO
(..)
18. Caso o participante tenha caucionado valor para item excluído, poderá fazer opção para outro item, desde que a caução realizada seja igual ou superior ao valor estabelecido para o novo item pretendido, bastando anexar o comprovante à nova proposta de compra.” (Grifos acrescidos).
Tal dispositivo torna a corroborar a conduta acertada da. De forma diversa, não há como aplicar a mesma inteligência, a toda evidência, no que se refere ao depósito do valor a menor da caução, sob pena de se desafiar três princípios basilares consagrados pela Lei nº 8.666/1993, quais sejam: vinculação ao instrumento licitatório, isonomia e julgamento objetivo.
De mais a mais, o Poder Público é o guardião da ordem jurídica e, neste mister, é o responsável por sempre buscar ao máximo alcançar o interesse público, em clara obediência ao princípio da legalidade estrita, expressamente disposto no caput do artigo 37 da Carta Magna, in litteris:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)”
Essa também é a orientação do ensinamento deixado pelo Prof. Hely Lopes Meirelles ao considerar que "a legalidade, como princípio de administração, significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso"5. É dizer, a atividade administrativa deve ser exercida em conformidade com os princípios constitucionais orientadores, dentre os quais, o da legalidade, segundo o qual a Administração somente pode fazer o que a lei antecipadamente lhe autoriza (princípio da legalidade estrita) e, neste sentido, também está vinculada aos requisitos por ela exigidos.
Noutro giro, como é cediço, a leitura e a análise dos editais de licitação devem ser sistêmicas, isto é, são válidas tanto as disposições contidas no edital quanto aquelas presentes nos anexos que o compõem; contudo, ambas condutas devem obediência aos já mencionados princípios norteadores estabelecidos legalmente, dentro os quais se destaca a vinculação da Administração ao edital do certame. Com efeito, o instrumento convocatório é a norma que regulamenta tanto a atuação da Administração como dos licitantes, além de representar uma segurança para ambos, de modo que “A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada”6.
Nesse mesmo sentido, o e. TCDF já se pronunciou sobre a matéria, a exemplo do julgamento do Processo nº 2012.0.110.824.503APC, cuja ementa do v. Acórdão é a seguir transcrita:
“DIREITO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO DA TERRACAP PARA A VENDA DE IMÓVEIS. DESCLASSIFICAÇÃO DE PROPOSTA REALIZADA EM DESCONFORMIDADE COM O EDIDTAL. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. PROPOSTA ACOMPANHADA DE CAUÇÃO INFERIOR À EXIGIDA PELO EDITAL. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO EDITAL. PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE E DA ISONOMIA.
I. Os atos administrativos são imantados por uma presunção de legitimidade e de veracidade que só pode ser desconstituída mediante prova concludente em sentido contrário.
II. Legitimidade e veracidade são atributos indissociáveis que conferem ao ato administrativo a presunção de terem sido realizados de acordo com a lei e de espelharem a conformidade com os fatos narrados ou atestados pela Administração Pública.
III. Longe está de representar formalismo exacerbado a desclassificação da proposta formulada em desacordo com o edital.
IV. Não há que se falar em formalismo, senão em cumprimento estrito das normas editalícias, quando a proposta é desclassificada pelo fato objetivo de sua desconformidade com o edital.
V. Como norma básica do procedimento licitatório, o edital submete aos seus termos tanto a Administração Pública como os licitantes, de maneira que não pode ter a sua aplicação ressalvada ou excepcionada, sob pena de ofensa aos princípios da isonomia e da impessoalidade.
VI. Recurso conhecido e desprovido.” (Grifos acrescidos).
(Acórdão nº 770.936, 4ª Turma Cível, Rel. Des. James Eduardo Oliveira, DJe de 26/3/2014).
Volvendo à análise do caso em tela, cumpre registrar que o interesse público primário é, indubitavelmente, o cumprimento do princípio da função social da propriedade. Nesse sentido, a sua necessária observância representa a prevalência do interesse público em detrimento do interesse privado. Em outras palavras, o direito de propriedade é um instrumento que visa precipuamente à consecução do bem-estar individual, que, diante de sua nítida importância à preservação da dignidade humana, figura expressamente como direito fundamental na Constituição Federal no inciso XXII de seu art. 5º; contudo, tendo em vista que o particular é um indivíduo que vive em sociedade, a Carta Magna também alçou ao patamar constitucional a função social da propriedade como garantia fundamental (art. 5º, XXIII, da CF), além de princípio expresso da ordem econômica (art. 170, III, da CF), de forma a conciliar o exercício do direito de propriedade com o interesse social – princípio da harmonização ou concordância prática.
Desse modo, em que pese o argumento de que o Erário deixaria de perceber um valor maior que o que efetivamente receberá, a arrecadação em si representa apenas o interesse público secundário a ser perseguido, razão pela qual a desclassificação da proposta não representa, sob qualquer aspecto, um desvio no atingimento do interesse público específico envolvido, o qual deve ser sempre a finalidade de qualquer ato da Administração Pública; ao contrário, em reverência à função social da propriedade (interesse público primário) é que devem ser observados os princípios já elencados pela Lei nº 8.666/1993.
Sobre o assunto, convém registrar o posicionamento adotado pelo e. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 869.843/RS7, segundo o qual “a Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas”.
Ante o exposto, haja vista a análise exarada na Informação nº 145/2014 – 1ªDIACOMP/SEACOMP, este Órgão Ministerial acompanha as sugestões propostas pela Unidade Técnica.
É o Parecer.
Brasília, 4 de setembro de 2014.
Marcos Felipe Pinheiro Lima
Procurador
ML2
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